Nestes últimos dias de 2005 intensifica-se a campanha presidencial e ontem surgiu um primeiro clímax com um retrospectivo debate entre os dois mais credenciados candidatos, Mário Soares e Cavaco Silva, no limiar do deselegante. Mário Soares ao ataque, Cavaco Silva tendo que se conter. Nos painéis exteriores de propaganda política Cavaco sabe que Portugal vai vencer, enquanto Soares ameaça - sempre presente, porventura animado pela leitura do último romance de Saramago.
O frio e as luzes anunciam a quadra natalícia e ZD abriga-se. O frenesim, o desespero consumista nas catedrais deste tempo que corre vorazmente, as mensagens formatadas que enriquecem as operadoras de telemóveis, o futebol à semana para não perturbar a festa da família, os mornos debates das presidenciais a tal obrigam. ZD abriga-se mas a comoção inevitável arrepia caminho e aparece: é Natal.
P.S. Na colheita realizada no artigo anterior, ZD não mencionou, por esquecimento imperdoável, o agridoce, vínico "Sideways" de Alexander Payne, filme singelo que o levou à descoberta do Pinot Noir.
Mais um ano que encontra o seu Dezembro crepuscular e propício para balanços mais ou menos irrelevantes.
Ponto de partida, Minho, com mais rigor geográfico, Paredes de Coura. Aqui decorreu o festival musical mais arrebatador dos últimos tempos. O cartaz, com um travo a pop rock alternativo fortíssimo, é irrepetível: entre as más sementes de Nick Cave (convertido ao gospel) e as nostálgicas descargas eléctricas pixianas, brilharam os cometas Arcade Fire e os indecifráveis !!!. Como alguém disse, quem lá esteve terá sempre Paredes de Coura.
Segue-se o Glorioso (título algo irónico se perspectivarmos um passado recente), de novo campeão nacional e com uma participação interessante na Liga dos Campeões. Intermitente e ainda relativamente frágil, o Benfica deixou de dar tiros no próprio pé e aproveitou a displicência alheia, que, com uma crise de vesícula aguda, quis menorizar o campeão, usando a confusão habitual da bola com o apito.
No percurso por páginas literárias, ZD confessa que andou às voltas com obras não muito recentes, mas a leitura de "O vento assobiando nas gruas" de Lídia Jorge confirmou-a como voz maior do romance português e o confronto com "Era bom que trocássemos uma ideias sobre o assunto" de Mário de Carvalho evidenciou um humor ácido e invulgar na prosa que por cá se faz.
Musicalmente, surgem de novo os Arcade Fire e a obra-prima "Funeral", aclamada por todos quadrantes e inevitável. Também incontornáveis: "Get behind me Satan" dos diabólicos The White Stripes, "Antics" dos marciais Interpol (somente descoberto em 2005) e "You could have it so much better" dos regicidas Franz Ferdinand.
Por fim, na sétima arte, um ano franciscano. Depois de um início promissor, com mais um clássico cortante do enorme Clint Eastwood - "Million dollar baby" - seguiu-se uma relativa aridez. Alguns oásis: a ironia açucarada de "Charlie e a fábrica de chocolate" de Tim Burton, a África de "O fiel jardineiro" de Fernando Meirelles, o desconcertante thriller "Wallace & Gromit: A maldição do Coelhomem" de Steve Box e Nick Park e o visceral "Oldboy" de Park Chan-Wook (Palma de Ouro em Cannes 2004, mas experienciado em 2005).
P.S. No título deste artigo, onde se lê Antologia de 2005, deve-se ler, Zorro Danado: Colheita de 2005
Um título como o que precede este artigo não encoraja a leitura destas linhas, portanto, em jeito de prólogo manhoso, ZD penitencia-se pelo seu insuficiente poder de síntese e assume a dedicatória não muito subtil integrada no suspeito título.
Os 30 anos, numa perspectiva particular, têm vindo a ganhar uma tonalidade simbólica que não será irrelevante. Ocaso de uma juventude que parece irremediavelmente perdida, aurora de uma existência responsável e mais familiar, os 30 anos transformam-se ocasionalmente numa sombra que arrefece os dias. O tempo corre e 31 anos que possuem a vantagem de olhar para os 30 de modo contextualizado.
Noite grandiosa no inferno da luz, a vitória do Manchester United estava assegurada(havia quem garantisse 0-3, hat-trick do Cristiano Ronaldo), o improvável, sal do futebol, aconteceu, e o Benfica segue em frente.
Jornada final da primeira fase da liga dos campeões, e novamente a calculadora acompanha o desenho do futuro do FCP e do SLB. Porventura será novidade somente para os adeptos portistas,que recordam e suspiram por um passado não muito longínquo (tão distante como o Stanford Bridge do Dragão).
O senhor holandês que treina o FCP (a quem só falta, no seu manual de substituições, trocar o guarda-redes por um lateral direito que joga habitualmente no flanco esquerdo) considera que, em dez embates, o reputado clube Artmedia ganha uma vez. Como já esgotou este capital, surge a derrota no seu horizonte. Falta saber se o Inter intercede pelo FCP em Glasgow.
Quanto ao SLB, chega a altura de concentrar os parcos recursos humanos na liga portuguesa e renunciar de modo forçado à Europa. Falta apenas saber quantos centrais vão entrar em campo pelo lado do Benfica.