A cinefilia de ZD tem andado arredada das salas de cinema e dos videoclubes. Ainda que, nas últimas semanas, tenha surgido o confronto com os contendores dos Óscares deste ano - The Hurt Locker, de Kathryn Bigelow (claustrofóbico relato da experiência da guerra, saturado com as cores do deserto) e Avatar, de James Cameron (Jurassic Park tintado pelas possibilidades de um espaço inverosímil, é nas Hallelujah Mountains que se encontra o culminar do delírio imagético), foi perdido na programação de um canal que emergiu o improvável acontecimento cinéfilo de 2010.
Filme de 1983, de Francis Ford Coppola, Rumble Fish ressoa um tempo em que o cinema norte-americano era risco poético. Percorrido pela espectral presença do Motorcycle Boy (Mickey Rourke) e pela sombra que envolve a relação com RJ, o irmão mais novo (Matt Dillon), é através da voz cava de Benny (Tom Waits), improvável filósofo, atrás de um balcão de uma cafetaria, que se verte a matéria trabalhada pelo filme:
«Time is a funny thing. Time is a very peculiar item. You see when you're young, you're a kid, you got time, you got nothing but time. Throw away a couple of years, a couple of years there... it doesn't matter. You know. The older you get you say, "Jesus, how much I got? I got thirty-five summers left." Think about it. Thirty-five summers.»
Se no fim de semana um entusiasmo contagiante assenhoreou-se da praça lusa, a não muito estimada segunda-feira gerou uma espécie de perplexidade no meio futebolístico.
A imprensa asseverava que as surpresas estariam ausentes da relação dos 23 para África do Sul 2010, porém o professor até no número de convocados ultrapassou as expectativas. Entre os 24 eleitos, lugares-comuns (Eduardo, Paulo Ferreira, Ricardo Carvalho, Bruno Alves, Pepe, Duda, Pedro Mendes, Raul Meireles, Deco, Cristiano Ronaldo, Simão, Nani, Liedson, Hugo Almeida), expectáveis (Beto, Miguel, Rolando, Fábio Coentrão, Miguel Veloso, Tiago, Danny) e inspirações (Daniel Fernandes, Ricardo Costa, José Castro).
O plano parece assentar numa linha defensiva de peso e nas correrias de Cristiano Ronaldo. No entanto, como afirma o sábio Jesus, um seleccionador não tem que saber treinar. Basta estar inspirado no momento da convocatória e é sabido que o professor has got a feeling.
Rumo ao Cabo da Boa Esperança, segue uma selecção espadaúda. Por cá ficam as frágeis expectativas.
Uma divisa latina no emblema de um clube com raízes intrinsecamente populares é a matriz de uma irracionalidade que percorre as veias e as artérias do povo benfiquista e ontem empolgou um país.
Convertida por Jesus, arrebatada por um futebol obcecado pela baliza adversária, a mole encarnada acreditou. Um Di Maria desconcertante, um Cardozo letal, um Saviola imprevisível, um David Luiz imperial, uma equipa ciosa da bola e ávida de vitórias. Ainda que toldado por uma profunda desavença em relação ao que o Benfica representa, qualquer espectador de futebol sabia que o Benfica seria o natural campeão e não era um exercício difícil reconhecer que algo estava para acontecer (houve quem apenas se apercebesse no último fim de semana da competição).
No entanto, na lógica que parece dividir o país, o Sporting Clube de Braga emergiu como travão de um movimento que não podia ser suspenso. Nos bicos dos pés apreciou as palmadas amigas e adiou a festa. No fim todos assistiram à festa benfiquista e sobrou a azia dos que descobriram uma costela (ou costeleta) bracarense.