Sexta-feira, 29 de Março de 2013
Da chuva, das vacas escanzeladas e da literatura
- Já por cá não ando desde de 2012 e, entretanto, choveu, o precipício encontra-se diante das nossas vidas e resistimos.
- Há longo tempo que defendo que quem nos desgovernou e se governou no período que nos separa do 25 de abril nunca nos trará à tona neste dilúvio europeu e para todos que tiveram responsabilidade política neste percurso desastroso o único conforto merecido é o do banco de réus. A discussão que tenta determinar o protagonismo é basicamente irrelevante. Cavaquismo, socratismo, coelhismo e ismos da mesma laia irmananam-se numa vocação protetora de interesses próprios - que se opõem irredutivelmente aos interesses do país - e numa subserviência a um poder económico (alguns bancos e algumas empresas que conveniente e oportunamente foram privatizadas) que acolhe os intervenientes quando o povo ingenuamente pensa que é o momento de mudar de atores políticos. Ainda que desejemos que o presente não passe de um labirinto, é provável, porém, que nos encontremos num beco sem saída e o voto popular seja um entretém para que se eternize o statu quo. Em Portugal o tempo para o povo é de vacas escanzeladas - e o povo continua a aguentar a pata de Coelho&Relvas&Gaspar&Borges&Companhia. Do edifício europeu restam os escombros e não foi necessária uma terceira guerra mundial.
- Nos intervalos que JA e F generosamente me concedem tenho percorrido páginas de Eça - «A cidade e as Serras» -, Aquilino - «Andam faunos pelos bosques», «O Malhadinhas», «Quando os lobos uivam» - e Mário de Carvalho - «Quando o diabo reza», «O varandim», »Ocaso em Carvangel» - e dificilmente se encontra linhagem de maior excelência na nossa literatura. Cultores obsessivos da palavra que respira uma língua portuguesa que se descobre, eles lançaram-se na maior aventura que se apresenta ao escritor - o estudo da espécie humana.