Mário-Henrique Leiria construiu uma obra discreta e seguramente não passará de uma nota marginal nos estudos da literatura portuguesa do século XX. No entanto, ZD há uns tempos atrás encontrou numa livraria os Contos do Gin-Tonic deste escritor, livro cuja primeira edição vem desse estimável ano que foi 1973 e que chegou em surdina à quinta edição. Colectânea de breves contos de um autor que não consegue escrever coisas compridas e que finalmente tem a oportunidade de usar o vocábulo imarcescível, Contos do Gin-Tonic encontra nesta bebida que percorre as mãos de sucessivas personagens as características dominantes dos contos: o frescor e a acidez. Na Pequena nota à segunda edição de fins de Julho de 1976 o autor sente-se como em 1973 - bastante chateado. A revolução não alterara o horizonte, todavia o autor afirma a vontade de nunca desistir. Deste cepticismo irreverente brota um conjunto de contos pontuados por uma originalidade de matizes surrealistas e por um humor amargo - Foi quando começou a descer a escada que notou que não tinha a perna (in A perna e os outros).
Do gin-tonic para um rio que chega dos Estados Unidos. O grupo Smog é uma criação de Bill Callahan, autor das margens do folk rock norte-americano. A River Ain't Too Much To Love foi o cd também encontrado recentemente por ZD e confirmou a magnanimidade de Bill Callahan. Em A River Ain't Too Much To Love a serenidade da guitarra é assaltada pela gravidade da voz e por versos de uma singeleza cortante. Um rio corre comprimido pelas margens e no seu lamento surge a certeza - Winter weather is not my soul / But the biding for spring...
Por fim, Tarantino. Opus cinco - À prova de morte. Os pés, o sadismo, a imperfeição do vinil, os corpos, a cinefagia, a perna, Tarantino inscreve de novo as marcas de um cinema que nos cola à cadeira na sala de cinema e reconstrói o cinema como arte de sedução, um cinema que será sempre à prova de morte.